Vejo agora na distância o desenrolar de uma vida. Não pretendo julgar, até porque quem seria eu para tornar-me a figura de um juiz? Respondo pensativo: se eu mesmo continuo nesse caminhar sem ater-me ao futuro, seja ele ainda no decorrer dos anos ou preocupar-me com outra dimensão que não conheço? Lembrei-me quando num ato de despedida de minha mãe, a urna que guardava seus restos, já decomposto em cinzas era depositado ao mar.
Num fração de tempo fora arrebatada por um estranho, que não a conhecia, nem mesmo sabia de sua história. Qual o valor que aquele ciclista conseguiria pela aquela caixa adornada? Teria ele o conhecimento de uma vida de 84 anos que ali tinha repousado? Era mais um aventureiro de tantos outros que ela havia conhecido durante a sua jornada. Talvez se perguntássemos ao seu espirito sobre o acontecido, diria que não tinha importância, porque finalizava a sua aventura de seu tempo.E era bem capaz de complementar que aproveitara que o tinha bem aproveitado.
Quando jovem mostrara sua rebeldia de uma garota despreocupada, que mais parecia um guri, escalando muros, subindo em árvores como um moleque que desafiava a própria lei da Natureza. Casou-se com um oposto, ao ser arranjado pela baronesa que nem mais detinha esse título. Continuava desfiando aquela figura materna, que tanto me influenciara. Era sorriso. Também gostava de pintar. Um dia deparei-me com uma pintura extranha, um palhaço desenhado com cores fortes, mas sua feição era triste e de seus olhos corria uma lágrima. Era um quadro inacabado, uma incógnita…
Talvez hoje, posso compreender o momento sofrido, desesperador, numa encruzilhada em busca de uma felicidade sonhada. Continuo minha caminhada! Percebo as águas roçando meus pés, limpando a areia que havia sido depositada no vai e vem da maré.
Como gosto desse caminhar na noite, sobre o manto de estrelas, não tão longe da avenida que sob seu dorso carros desfilando com seus passageiros, barulhentos, ora indo ao fim da praia, ora voltando por outra via, para dar continuidade nesse corso colorido. Uns se deliciavam com esse desfile noturno, outros vociveravam com aquele barulho que lhes era infernal.
Porém, ao final da temporada de mais um verão, o silêncio voltava e as janelas agora escuras dava a impressão de uma cidade fantasmagórica. Talvez por isso, gostava mais de cidades litorâneas, do que balneários de temporada. Mas, secretamente diria: praia é praia. Mudei meu pensar para retornar ao meu quarto onde me delicio nas imagens do meu passado, a frente do meu computador, parceiro de meus segredos.
Respiro profundamente, olho para a janela, que outrora me transportava às nuvens desviando das florestas de prédios que se opunham à minha frente e deixava-me voar. Voava! Enregava-me à inspiração e as lembranças que povoavam meus pensamentos. Assim misturava as cores da juventude, na palheta da vida, com os meus anos, não de velhice, mas de tempos vividos, renovado por essas lembranças. E no silêncio das palavras, sorria não porque era o fim, mas o continuar na empolgação da minha vida. Feliz meus 77 anos!
EDUARDO PRUGNER é consultor empresarial e sócio da Prugner’s Digital Marketing, palestrante, escritor e poeta. Informações sobre o tema pelo e-mail: eprugner@gmail.com.