“Aquele que quer ser tirano e não mata a Bruto e o que quer estabelecer um Estado livre e não mata os filhos de Bruto, só por breve tempo conservará sua obra.” (Nicolau Maquiavel)
Ao contrário do que se pode pensar, Maquiavel não foi um cara “maquiavélico”, no sentido mais demonizado que o termo assumiu. A adjetivação oriunda de seu nome não deveria se aplicar a ele. O que fez esse formidável pensador político foi identificar as regras desse jogo intrincado e revelá-las àqueles que ainda imaginam ser essa arena lugar para ingênuos.
Ao tratar de política, Maquiavel fez o que ninguém antes havia feito. Abordou a questão de forma realista, como ela é, e não como idealmente deveria ser. Não há considerações delongadas acerca da honra e da ética. Toda aquela conversa em torno de religião e ética misturada com política soa por demais hiócrita aos seus ouvidos. De algum modo Maquiavel está dizendo: “Vamos ser francos aqui. Essa arena não é lugar para santos… O uso da devoção é desejável, mas o emprego da força é necessário, seja ela de que modo for.”
A frase pela qual é mais lembrado: “Os fins justificam os meios”, ainda que erroneamente compreendida – segundo os especialistas quis dizer que os fins determinam os meios – expressa bem que o labor político não deve se sujeitar às regras éticas, como um beato tentando obedecer seu catecismo. As manobras, os segredos e denúncias, os subornos, o tráfico de influência, para citar algumas das contas desse enorme rosário, são recursos comuns nesta arte, aos quais todos, vez por outra ou quase sempre, recorrem.
É impossível precisar quando exatamente a humanidade testemunhou suas primeiras escaramuças políticas. Em tempos remotos nalgum lugar nos enclaves férteis do Crescente, nas úmidas florestas tropicais das américas, nas savanas africanas ou nas pradarias intermináveis do coração da Ásia, homens mediram forças e armas para assegurar o controle sobre o seu grupo. Primeiro foi a força bruta. Não apenas os feios e fedorentos Neandertais se utilizaram desse expediente macabro para se impor. O presunçoso Homo Sapiens, desde que teoricamente emergiu das cavernas lúgubres para inventar a civilização, também tem feito o mesmo.
Ainda que continuemos nos matando – os métodos já refinados garantem suavizar impacto da barbárie – já não se faz uso da borduna e do tacape. Inventamos a militância política, um jeito manhoso de se passar a perna nos opositores, sem ter que necessariamente atravessar-lhe com uma lança. Uma das acepções do termo “campanha” é guerra. Um político em campanha não é apenas um bom cidadão querendo cuidar dos interesses da Polis, mas um dos reclamantes à coroa. Ao entrar numa batalha para tentar assegurar seu naco na partilha dos despojos, não é raro que contendores usem todos os recursos disponíveis.
Política sempre envolveu violência. Os primeiros governadores dos povos foram guerreiros que não hesitavam em cortar as cabeças de seus desafetos. Assim, os meios militares presentes na disputa pelo poder desde há muito revelam o caráter belicista desse mister; Numa guerra muitas vezes a primeira coisa que se anula são as regras da ética, e isto pode ser verificado em todo tipo de campanha, desde uma disputa de grande proporção até, pasme o leitor e admita constrangido, uma eleição de condomínio!
No que respeita a esse condomínio continental da terra brasilis, vemos nesses dias, como em toda campanha, as denúncias, os dossiês, calúnias, farpas, revelações, golpes baixos, visando destruir o adversário.
Um exemplo disso foi o que aconteceu durante a campanha para presdiente da República no Brasil.
Eu, como certamente você também, recebi uma enxurrada de emails retratando uma das candidatas à presidência como a um demônio, vestido de Prada, é claro. Demonizar a candidata da forma como tenho observado, acho maquiavélico demais. É partilhar dos mesmos valores que contornam e adornam a mentalidade daqueles que se lançaram na disputa sem se importarem com os meios, desde que atinjam os fins desejados.
Não cabe aqui falar das táticas de campanha dos candidatos, mas de alertar que devemos agir éticamente, mesmo em campanha. Que isso nos sirva de exemplo.
» LUIZ LEITE é pastor, administrador, escritor e psicanalista na cidade de Belo Horizonte. É autor dos livros “O Poder do Foco” e “Inteligência do Evangelho”. Blog: luizvcc.wordpress.com.