Os ônibus de turismo que fazem os chamados “Katrina Tours”, passeios pelas áreas afetadas pelo furacão que devastou Nova Orleans em 2005, têm parada obrigatória em frente à nova casa do contador Robert Lynn Green Sr.
Diante da residência no Lower 9th Ward, uma das regiões mais destruídas pelo Katrina, os guias mostram aos turistas a coroa de flores que Green, 55 anos, depositou no local em homenagem a sua mãe e sua neta, mortas na tragédia.
Também chama a atenção um cartaz que diz: “Nós queremos que nosso país nos ame tanto quanto nós amamos nosso país” e, logo adiante, pede ao então presidente George W. Bush que reconstrua a casa destruída de Green, “e não o Iraque”.
Há ainda um pedaço de uma escadaria, três degraus que são o que restou da antiga residência do contador, destruída pelas águas que inundaram a cidade após o rompimento dos diques em 30 de agosto de 2005, um dia após a chegada do furacão.
“Nossa casa flutuou pela rua, como um barco, até aquela esquina”, diz Green, apontando para um cruzamento quarteirões adiante.
Mortes
Era madrugada quando o bairro, localizado às margens do rio Mississippi, foi invadido pelas águas.
“Meu irmão estava dormindo com a mão para fora da cama e sentiu a água”, diz Green.
Além dele e do irmão, estavam na casa sua mãe, Joyce, 73 anos, três netas, de quatro, três e dois anos, e um primo.
“Tivemos cinco minutos para subir até o sótão. Outros cinco para subir no telhado.”
Foi então que, segundo Green, a casa se desprendeu do solo e começou a flutuar na água.
“Minha neta Shanai, de três anos, foi arrastada do telhado e desapareceu na água. A casa ruiu embaixo dos nossos pés”, conta.
Ele diz que a família ainda conseguiu se abrigar no telhado de uma casa vizinha, e lá permaneceu por pelo menos cinco horas.
“Minha mãe já havia se afogado, mas conseguimos salvá-la e a ressuscitamos. Mas ela não aguentou ficar tanto tempo no telhado, com toda aquela água, e acabou levada novamente. Minha neta morreu às 4h da manhã. Minha mãe, às 13h”, diz.
Tentativa de fuga
Green diz que a família havia tentado fugir da cidade um dia antes da passagem do Katrina, quando já havia alertas de que o furacão iria atingir a cidade em cheio.
“Não foi nossa escolha ficar aqui. Tentamos ir para Nashville (no Estado do Tennessee), mas o tráfego nos impediu”, diz.
“Voltamos e, na noite de domingo (28 de agosto, véspera da passagem do Katrina), pedimos abrigo no Superdome (estádio em que muitas das vítimas se refugiaram inicialmente e que acabou se transformando em símbolo da tragédia)”, afirma.
“Eles nos mandaram embora, porque minha mãe tinha problemas de saúde, era cardíaca, e precisava de cuidados médicos. Tivemos de voltar para casa.”
Resgate
Depois de passar horas no telhado, sem saber onde estavam a mãe e a neta, Green e os demais foram resgatados por três vizinhos. Foram então, levados ao Superdome.
“Cheguei lá só com as calças. Sem sapatos, sem camisa. Sem nada”, diz.
O corpo da neta só foi encontrado dois meses depois, em outubro de 2005. O da mãe, ele mesmo resgatou, em dezembro daquele ano, no lugar onde ela havia se afogado.
Green viveu alguns meses fora de Nova Orleans mas, quando voltou à cidade para enterrar a mãe, resolveu ficar.
Morou em trailers durante três anos, até se mudar para a nova casa, em julho de 2009.
A construção foi feita pela fundação Make it Right, do ator Brad Pitt, que pretende erguer 150 casas no Lower 9th Ward.
“O governo não fez o que deveria”, diz Green, referindo-se ao governo de Bush. “Minha mãe trabalhou 25 anos na Força Aérea. Seu caixão foi coberto com a bandeira dos Estados Unidos.”
Sobre a recuperação do bairro, onde vive desde 1967, ele se diz satisfeito, mas afirma que ainda é preciso trazer de volta os que não conseguiram retornar.
“Quando o Katrina chegou, esperávamos voltar em algumas semanas e retomar nossas vidas. Ninguém imaginava que iria levar cinco anos.”